• por Flavio Ferrari
Dois princípios podem nos ajudar a imaginar o futuro: o do desejo e o do retorno. Quer saber oque o amanhã nos reserva? Siga o dinheiro!
O que nos reserva o futuro? Essa pergunta, que ocorre a todos nós de vez em quando, não tem uma resposta única e inquestionável. No futuro, tudo pode acontecer.
Mas, dois princípios podem nos ajudar a imaginar o futuro ou, pelo menos, identifica quais os “futuros” com maior probabilidade de ocorrer.
O primeiro é o “princípio do desejo”: nada muda se não existe o desejo de mudança. E por desejo, aqui, entende-se uma determinação visceral de transformar algo que nos traz insatisfação ou conquistar algo que nos fará mais felizes.
O segundo é o “princípio do retorno”: nada muda se a mudança não valer a pena. E por valer a pena, aqui, entende-se pagar o “custo” da mudança com alguma margem de “lucro”. Mudar é sempre mais difícil do que permanecer como estamos.
Do ponto de vista pessoal, o primeiro princípio im- pera. Tomados pelo desejo, atuaremos para transformar o que estiver ao nosso alcance e, ainda que não sejamos capazes de atingir nossos objetivos, algo irá mudar a partir de nossas ações.
Do ponto de vista social, coletivo, o segundo princípio tende a ser mais importante.
O Ocidente, onde vivemos, é capitalista, ou seja, pautado pela ideia de gerar lucro e acumular riquezas.
Isso significa que nosso futuro coletivo tenderá a ser orientado pelo dinheiro.
Não é uma crítica ao capitalismo; é a constatação de um efeito colateral.Tudo aquilo que não tem potencial para gerar receitas relevantes, com possibilidade de lucro, não será feito, mesmo que pareça ser algo justo e benéfico.
Laboratórios farmacêuticos não irão investir para descobrir tratamentos de doenças raras, porque a venda dos medicamentos eventualmente descobertos não irá cobrir os custos da pesquisa e do desenvolvimento. E esse raciocínio vale para todo o mais, e não apenas para áreas críticas como saúde, saneamento básico, educação, infraestrutura e meio ambiente. Não existe nenhuma razão que justifique o investimento privado naquilo que não trará retorno financeiro. Em tese, pagamos impostos para que os governos façam esse tipo de investimento. Digo “em tese” porque, na prática, os políticos também esperam retorno em votos, e tenderão a utilizar essa métrica para priorizar os investimentos. Mas nós, consumidores, também somos agentes determinantes dos rumos das indústrias. Quem, de fato, aceita pagar mais caro por um produto “sustentável” (produzido com práticas ESG)? Pensamos nisso quando escolhemos cada produto em um supermercado? Dando um passo mais além, rumo a algo mais existencialista, nosso valor individual é definido pelos resultados financeiros que somos capazes de proporcionar, para azar dos filósofos e artistas. Pensar e criar com liberdade não são atividades reconhecidas como remuneráveis, a priori, exceto quando produzem algo comercializável. O valor da remuneração média dos profissionais numa sociedade é um bom indicador, não apenas do que é considerado relevante, mas do caminho que estamos trilhando. Claro que esse raciocínio não é unidimensional e linear. O Messi não ganha US$ 126 mil por dia porque a sociedade francesa acredita que o futebol é a coisa mais relevante do mundo. E, segundo a Forbes, o youtuber mr. Beast faturou mais do que isso em 2021 com seus vídeos de desafios. Em ambos os casos, a cadeia de relevância está suportada pela popularidade e pela capacidade de “vender” produtos.
Filósofos e artistas populares também podem ser bem remunerados, menos por suas ideias e mais por sua capacidade de produzir entretenimento em um ambiente seguro para as marcas.
Contudo, nada nos impede de pensar e criar com liberdade, desde que tenhamos alguma outra atividade com valor reconhecido pela sociedade para pagar as contas.
E, voltando à pergunta inicial, quer saber o que nos reserva o futuro? Siga o dinheiro. Ele vai apontar os rumos da sociedade e os castelos que surgirão.
Mas, lembre-se que você também pode colocar suas pedras nessas obras, enquanto batalha pelo que deseja.
Flavio Ferrari é head of ad Innovation & strategy – CNN Brasil e co-autor do livro Acumen – The Future Castles Stones.